Pesquisadora com atuação no PR se torna primeira brasileira a conquistar ‘Nobel da Agricultura’: 'Jamais poderia imaginar'
25/05/2025
(Foto: Reprodução) Mariângela Hungria trabalha há mais de 40 anos em pesquisa de insumos biológicos para melhorar fixação de nitrogênio em lavouras de soja e evitar uso de agrotóxicos. Pesquisadora com atuação no PR se torna 1ª brasileira a conquistar ‘Nobel da Agricultura'
Desde criança, a paulistana Mariângela Hungria sabia que queria trabalhar com alimentos quando crescesse – e foi esse desejo que a levou para a área da pesquisa. Agora, com mais de 40 anos de carreira, seu trabalho foi reconhecido pelo Prêmio Mundial de Alimentação (World Food Prize – WFP), considerado o “Nobel da Agricultura”.
A premiação é fruto do trabalho da pesquisadora no desenvolvimento de insumos biológicos para melhoramento de lavouras no Paraná. Ela identificou e selecionou bactérias que ajudam pés de soja a fazer a fixação do nitrogênio, nutriente essencial para o desenvolvimento das plantas.
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Mariângela diz que sempre acreditou no poder dos microrganismos para transformar a agricultura em uma atividade mais produtiva, competitiva e sustentável.
“Não tenho dúvidas de que, se não fosse a fixação biológica de nitrogênio da soja, hoje não seríamos os maiores produtores e exportadores do mundo, porque seria inviável economicamente”, diz.
Pesquisadora se torna primeira brasileira a conquistar ‘Nobel da Agricultura’
Caminhos do Campo/RPC
Pesquisa existe há séculos
No início, e por muitos anos, ela ouviu que aquela era uma pesquisa sem futuro, que grandes produções só seriam possíveis com o uso de fertilizantes químicos. Porém, ela seguiu investigando.
A associação das bactérias com as plantas é motivo de pesquisas há mais de um século. No Brasil, esses estudos começaram com a expansão comercial da soja na década de 1960, mas não avançaram muito. No início dos anos 1990, a pesquisadora resolveu assumir o desafio.
Segundo Hungria, ela recomeçou todo o trabalho, verificando o melhor desempenho, quais eram as bactérias presentes e como que elas deveriam ser utilizadas.
“Tinha o plantio direto, que era pouco na década de 1960, tinha o tratamento de sementes com outros agrotóxicos, tinha que ver a compatibilidade e as cultivares eram outras cultivares, com rendimento muito maior. Eu tinha que verificar se essas bactérias davam conta”, explica.
Mariângela conseguiu selecionar microrganismos eficientes e tecnologias que permitem alto rendimento e baixo custo por vias biológicas.
'Jamais poderia imaginar', diz pesquisadora sobre premiação
Caminhos do Campo/RPC
Maiores benefícios para o setor
A "bradyrhizobium", nome científico da bactéria, forma nódulos, normalmente nas raízes das plantas. Esses nódulos funcionam como uma espécie de “fábrica” de fertilizante nitrogenado.
Para que as bactérias sobrevivam e se multipliquem até chegarem ao agricultor, Hungria explica que elas são colocadas em um saco líquido, desenvolvido na Embrapa, onde a pesquisadora trabalha. O produto é um meio de cultura chamado inoculante, que é misturado à semente da soja na hora do plantio.
Hoje, a inoculação é adotada em cerca de 85% da área cultivada com soja no país, o que corresponde a, aproximadamente, 40 milhões de hectares. Apenas em 2024, esta tecnologia propiciou uma economia estimada em R$ 140 bilhões.
Pensando no futuro do planeta
O nitrogênio químico - base de fertilizantes como a ureia - é um produto caro e precisa ser importado, a maior parte da Rússia e da China. Produzi-lo de forma biológica, sem queda de produtividade nas lavouras, pode garantir diferentes vantagens para além da ecônomia.
"Além disso, você vai melhorar a saúde do seu solo, ter alimentos mais nutritivos e estar contribuindo para o planeta, para não emitir tantos gases de efeito estufa. Esse foi nosso diferencial," explica.
Alexandre Nepomuceno, chefe-geral da Embrapa Soja, explica que a técnica desenvolvida pelas equipes de Mariângela ajuda a reduzir consideravelmente as emissões de poluentes. “Quando você usa, por exemplo, ureia para adubação nitrogenada, você emite muito óxido nitroso, que é 300 vezes mais poluente que o CO2”, ele diz.
Outras culturas, como milho, trigo, feijão também são beneficiadas com essa tecnologia, mas a bactéria usada é diferente.
Prêmio histórico
O reconhecimento internacional com o Prêmio Mundial da Alimentação foi surpresa para a cientista brasileira, que trabalha na Embrapa desde 1982. É a primeira vez que uma mulher conquista esse prêmio no país.
"Quando eles ligaram para contar, eu pensei que era para convidar para dar uma palestra, eu fiquei tão feliz, comecei a agradecer, eu não parava de falar, eu estava muito elétrica. Aí eles falaram assim, ‘Calma, podemos falar agora? Você vai poder falar, mas é porque você ganhou.’ Eu ganhei o quê? ‘Você ganhou o prêmio.’ Nossa, comecei a chorar, jamais poderia imaginar”, se recorda.
A solenidade de entrega da homenagem à pesquisadora será em 23 outubro, nos Estados Unidos.
Pesquisadora se torna primeira mulher brasileira a conquistar ‘Nobel da Agricultura’
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